Vivemos atualmente uma crise profunda de confiança nas instituições tradicionais: governos, mídia, ONGs e até mesmo nas marcas.
O relatório Edelman Trust Barometer 2024 revelou que, apesar das empresas serem vistas como a instituição mais confiável globalmente, com um índice de confiança em torno de 60% ou mais, há um crescente temor de que a “inovação esteja sendo mal gerida”, ampliando o ceticismo público e impactando a credibilidade das marcas.
A pesquisa apontou que quase duas pessoas para cada uma acreditam que essa incompetência em regular a inovação gera riscos reais à sociedade.
A confiança do consumidor é um ativo estratégico e cada vez mais volátil. Imagem: Reprodução/ iStock
Nesse cenário, a desinformação (que inclui fake news, deep fakes e greenwashing e outros) emerge como um fator crítico que minimiza ainda mais a credibilidade das marcas.
Ainda mais com o crescimento da Inteligência Artificial e a construção de ferramentas cada vez mais realistas de atividade criativa e consequentemente amplia a criação irreal de informações.
Essas formas de desinformação operam em conjunto para dissolver a confiança instaurada entre marca e consumidor, tornando mais difícil para as empresas manterem sua reputação de forma genuína.
A desinformação digital compromete diretamente a reputação das marcas. Imagem: Reprodução/ iStock
Por isso, o entendimento dessa crise de confiança e das estratégias digitais distorcidas é essencial para refletir sobre o impacto das marcas na sociedade atual.
Afinal, já dizia aquele velho ditado “mentira tem perna curta” e “a internet não perdoa”. Se uma marca se dispõe a basear seu propósito e sua solução em falsidades, em pouco tempo o “exposed” aparece e tudo cai por terra.
O impacto da desinformação ultrapassa o ambiente digital e molda diretamente o comportamento de compra dos consumidores. Empowered consumers, ou seja, os consumidores conscientes e críticos, estão cada vez mais atentos aos valores por trás das marcas antes de decidirem comprar.
Afinal, 91% dos brasileiros já esbarraram em fake news online, mas isso não quer dizer que os consumidores não compreendem sua gravidade. Na verdade, eles estão cada vez mais atentos ao que é real.
Sem transparência, não há construção de marca sustentável. Imagem: Reprodução/ iStock
Imagine isso: sua marca está bombando. Mas para manter aquele buzz, resolve plantar umas verdades “alternativas”. Pode até virar viral, mas cuidado: o público percebe. E a punição é sintomática: 69% dos consumidores surgem para te dar unfollow ao ver seu anúncio ao lado de fake news.
Um exemplo que chamou a atenção de todo o Brasil foi o caso da influenciadora Virgínia, que enfrentou uma queda significativa no número de seguidores no Instagram após o depoimento na CPI das Bets, com mais de 117 mil pessoas deixando de acompanhá-la, segundo o Social Blade.
Virgínia prestando depoimento na CPI das Bets. Imagem: Reprodução/ Metrópoles
Quando falamos sobre branding, falamos sobre construir e gerir a reputação de uma marca no mercado. Fazemos isso através de ativações de mídia e marketing, instaurações de cultura, reforços de marca e clareza do posicionamento. Porque afinal, uma boa reputação se constrói com confiança. Sem confiança, a água é turva e o ceticismo grande para nossos consumidores.
Então, se nossos consumidores já vêm até nós com um “desconfiômetro” ativado, porque ainda existem negócios que tentam burlar a verdade e enganar os clientes com desinformação?
Influência digital sem responsabilidade é risco reputacional. Imagem: Reprodução/ GZH
Muitos criadores de conteúdo incentivaram o público, inclusive jovens, a jogar sem alertar sobre os riscos de vício ou perda financeira, o que gerou forte reação pública e ações de fiscalização.
Mesmo com algumas melhorias a serem feitas, a imprensa tradicional ainda é o bunker da credibilidade. No Brasil, 43% das pessoas dizem confiar mais em veículos tradicionais do que em outras fontes de informação.
E esse dado é um trunfo para quem anuncia: a TV, o rádio e os jornais impressos ainda são canais capazes de entregar mensagens com menos ruído e mais legitimidade.
Em um mundo hiperconectado, onde a timeline não para e qualquer um pode publicar qualquer coisa, a confiança virou moeda rara e cara.
Credibilidade não se improvisa: é construída com ética e coerência. Imagem: Reprodução/ iStock
É por isso que, para quem quer construir uma marca com consistência, credibilidade e reputação sólida, pensar em mídia tradicional não é nostalgia: é estratégia.
Isso não significa abrir mão de ousadia. Seja esperto, seja provocativo, explore o que é edgy, vá além do óbvio, mas sem flertar com a desinformação. Porque uma coisa é certa: o consumidor já não é mais ingênuo.
Ele sabe distinguir verdade de manipulação, autenticidade de oportunismo. E quando a percepção de confiança se quebra, sua marca deixa de ser inspiração e vira meme. Vira piada… Vira exemplo do que não fazer.
Marcas precisam de mais conteúdo genuíno e menos discurso publicitário. Imagem: Reprodução/ iStock
A reconstrução da reputação depois de uma crise é possível, claro, mas é sempre mais cara. E, em muitos casos, mais longa do que o hype que a provocou.
Por isso, deixo aqui uma provocação para quem vive de mídia e marketing: desafie os limites da criatividade, não os da ética. Invista em ideias ousadas, inteligentes e memoráveis, não em atalhos perigosos em busca de likes fáceis.
No fim, vale mais ser lembrado por uma campanha brilhante do que se tornar o próximo case de cancelamento.
Seja audacioso. Mas nunca irresponsável. Porque a credibilidade ainda é, e sempre será, um ativo inegociável.